O conceito de número


Muitas crianças mais novas têm determinada habilidade de contar fluentemente de 1 até 10. Esta cena é comum em todos os ambientes, mas será que a criança conhece o número e sabe identificar o que ele representa? Será que ela construiu o conceito de quantidade?
Saber contar verbalmente não significa que ela compreenda o conceito de número e nem mesmo possua condições de aprendizagem dos mesmos. Piaget investigou os processos mentais inseridos na construção do conceito de número. Os seus estudos comprovam que a criança não pode conceituar adequadamente o número, até que seja capaz de conservar quantidades, tornar reversíveis as operações, classificar e seriar.
Para possibilitar à criança a construção da estrutura do número e o desenvolvimento do raciocínio lógico-matemático, cabe ao professor selecionar atividades e explorar as atividades diárias que possibilitem agrupar e desagrupar elementos, comparar quantidades, estabelecer critérios para classificar, seriar e criar soluções para a resolução de situações-problema. Ao final dos estudos complementares do fascículo 1 vocês saberão como elaborar atividades práticas para avaliar o nível em que seu aluno se encontra.
Para o professor entender as diferentes etapas de desenvolvimento da criança, sua forma de pensar, e consequentemente planejar sua intervenção, para auxiliar e encorajar seu aluno no desenvolvimento de seu raciocínio na construção do conceito de número, ele precisa conhecer como se processam essas etapas de desenvolvimento.
Algumas noções básicas sobre as estruturas lógicas elementares e aquisição dessas relações construídas pelas crianças, em sua interação com os objetos da suas realidade são:
 




CLASSIFICAÇÃO

 -“Operação lógico-matemática realizada sobre as semelhanças existentes entre elementos. Em outras palavras significa reunir objetos semelhantes”.
 (Ângela Piaget)
- “Agrupar objetos de um dado universo, reunindo todos os que se parecem num determinado valor de atributo, separando-os dos que deles se distinguem neste mesmo atributo”. (Ângela Rangel)



CONSERVAÇÃO

- “Reconhecimento da invariância em substância, peso, extensão, número, volume e/ou espaço das transformações de forma, posição ou agrupamento”.
(Ângela Piaget)
- “Pensar que a quantidade continua a mesma quando o arranjo espacial dos objetos foi modificado” (Constance Kamii)


SERIAÇÃO

É a operação lógico-matemática desenvolvida ao ordenar objetos de acordo com determinados atributos, em ordem crescente ou decrescente, por exemplo, caminhando à abstração reflexiva.


A aquisição dessas estruturas lógicas é gradativa e individual. A criança começa a estabelecer relações a medida que pensa e levanta hipóteses. O professor deverá criar oportunidades para a criança pensar ativamente, instrumentalizando-a para estabelecer as relações, estimulando-a ao desenvolvimento dessas estruturas lógicas.
         Constance Kamii descreve os tipos de conhecimento como sendo três: físico, lógico-matemático e social.
         O conhecimento físico é o conhecimento visível dos objetos, ou seja, suas características externas. O tamanho, a cor, o peso e a forma de um objeto são exemplos de propriedades físicas observáveis.
Ao observar dois lápis, um vermelho e um amarelo, percebemos a diferença entre eles. Essa diferença  é o pensamento lógico-matemático. Esse conhecimento é a capacidade de estabelecer e coordenar relações. É a relação mental que o indivíduo processa para confirmar ou não suas hipóteses. Este tem como princípio básico a construção de um sentido próprio e individual para a resolução de desafios que surgem.
A construção do conhecimento físico e lógico-matemático tem sua estruturação e sustentação de formas diferentes.
Piaget descreve dois tipos de abstrações. Abstração empírica as abstrações observáveis externamente dos objetos, ou seja, o conhecimento físico; e Abstração reflexiva as relações mentais construídas pela criança, ou seja, o conhecimento lógico-matemático.
Na abstração empírica a criança evidencia determinada característica do objeto, como, por exemplo, a cor, e ignora as demais características (peso, forma, tamanho, material utilizado, etc.). Já na abstração reflexiva, ocorre a coordenação de relações mentais entre os objetos: a diferenciação entre as cores vermelhas e amarelo. A criança compreende o número através da abstração reflexiva.

Psicologicamente falando, ...”não é possível que um dos tipos de abstração exista sem o outro”... Kamii. Quando a criança compreende que seu sapato é verde, ela utiliza um esquema classificatório, para diferenciar o “verde” das demais cores, e também utiliza outro para diferenciar “sapato” de outros objetos que já conhece.
Já o fato de saber que a TV foi feita para assistir e o telefone foi feito para ligar são exemplos de conhecimento social.
A idéia de número que ocorre através da abstração reflexiva (conhecimento lógico-matemático) é aplicável a todos os povos.
Sendo assim, número “... é uma síntese de dois tipos de relações que a criança elabora entre os objetos (por abstração reflexiva). A primeira relação é a ordem, a outra é a inclusão hierárquica.” Kamii
A relação de ordem é construída mentalmente pela criança. Ela ordena os objetos para garantir que não se esqueça de contar nenhum dos objetos, que não conte objetos inexistentes e nem conte mais de uma vez determinado objeto. A característica mais comum em crianças que não ordenam mentalmente os objetos no ato de contar, faz com que as mesmas esqueçam de contar algum objeto, ou contem mais de uma vez um determinado objeto.
A relação de inclusão hierárquica compreende a inclusão mental do 1 no número 2, do 2 no número 3, etc.
Se uma criança, ao contar até 10, for capaz de identificar um sequência ordenada e se compreender a estrutura da inclusão hierárquica, podemos afirmar que esta criança está em pleno processo de construção do conceito de número, o qual será reconstruído durante toda a sua vida.